sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Os dias seguintes

Acho que faço tudo errado. Só pode ser. Falo errado, como errado, bebo errado, entendo mal, quando penso que me organizei, que me resolvi, tenho que parar pra ver o morto, explicar e descomplicar. Chega!

Não entendo - e nunca vou conseguir - porque diz que vai ligar e não liga, e não suporto quando liga dizendo que quer me ver, mas não diz nada, mesmo depois de falar tanto de tantas e pouco de muitos. Aí, se decido te ligar ou mandar alguma mensagem aos primeiros sinais daquele pilequinho das quintas-feiras, com as meninas, você pode achar que sou oferecida, que estou carente e, a melhor, que sou muito mulher pra você. Ora! Me cansei de fingir que não me importo quando vamos sair e você enumera, durante todo percurso do seu monólogo, seus relacionamentos mal sucedidos. Tudo bem que nos entendemos bem, que da nossa relação só nós sabemos, e como nos damos, nos temos, nos doamos. Tenho saudade mais de mim do que de você quando me surpreendo perguntando como éramos antes de nos conhecermos.

Acho que já não tem mais graça de brincar de gato e rato, melhor dizendo, de cão e gata, porque você só aparece quando lhe convém, quando você sabe que minha cama está vazia, mas minha cabeça, sim, cheia de dúvidas, com certeza. Aí, com a cabecinha confusa, deixo que meu coração pense, e é aí que não há razão que caiba dentro de mim, só o seu corpo cansado e suado debruçado sobre o meu. Sobre nós, não há quem nos desate, mesmo com ferida aberta pela sua ausência dos dias seguintes.

Quando você desmarca comigo porque diz que vai beber, porque diz que está cansado, fique tranqüilo, não é só você, meu bem, mas, aí, depois, tenta me fazer acreditar que tem trabalhado muito. Você está mentindo, eu sei, mas também sei que preciso mentir duas vezes por causa disso: minto pra ti, quando finjo que acredito, e minto pra mim, quando finjo que estou forte. Você sabe realmente de mim? Você me conhece mesmo? Eis aí quem se engana.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Mãos

Minhas mãos são dois destinos
Vidas
Meu amores mais sentidos
Linhas

Meu coração é direção desconhecida

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Cabelos, sorrisos e choros

Mexi os cabelos mais uma vez, respirei fundo e não respondi. Encarei, como se meus olhos fossem duas miras precisamente posicionadas naquela direção, entendi, como que meus delírios e devaneios, por um instante, fossem luz e não equívoco, sorri, porque meus dentes afiados e exaustos de desenganos, por dois momentos, entenderam que você não sabe das coisas, mas pensa que sabe, e eu, pobre de mim, sinto que sei e sei que não vou sentir desejo maior que é não te ter mais em mim. Chorei, menos quando percebi que de nada vai adiantar fazer as pazes com você, se não tenho amor por mim, se não aprendi que apanhar de amor é bater de raiva, a mesma raiva que sinto quando desejo estar nos seus braços. Chorei mais depois que me arrependi de ter agido daquela maneira, quando caminhei pela estrada onde me conheci antes de saber quem estava procurando.


Depois fechei os olhos. E antes de voltar a enxergar, vi que mesmo que tenha demorado menos que o intervalo de um sonho, senti que meu corpo inteiro coube naquela lágrima e que nada vai me fazer ficar. Então sorri de novo, mesmo que minha alma não coubesse em minha boca.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Falhas e defeitos

Falta-me espaço, mas gosto de alimentar a boca dos homens como as migalhas do tempo saciam os famintos sem destino. A minha revolta é contra o desperdício da fome de nós mesmos. As pessoas não se dão, não se descobrem nunca, escondem-se sob as cobertas felpudas da ignorância, ficam amordaçadas pela necessidade de fazer algo que já se faz, construindo algo que já foi erguido, devastando corações que nunca amaram. Volta e meia me sinto burra (e hoje me perguntaram se não gostava de trabalhar), mas, confesso a duras penas, pior que sentir-se burra é servir-se de burra. Saciar a fome de cavalos selvagens que habitam cidades, algumas éguas de patas cristalinas que relincham desesperadas por, essas sim, migalhas de piedade e compaixão, porque posso não ser uma mulher perfeita, mas há falhas em mim que não são defeitos. Fiquei empedernida quando tive que explicar mais uma vez que toda mulher é frágil – e não fraca.



Despertei do sono por causa da tristeza que tomou conta de mim. Não sei bem o que aconteceu, mas de vez em quando sou dada a isso. Esqueço que existo, procuro por mim dentro dos outros, lembro de sentir saudade e depois descubro que não, que, não era isso. Vontade que me dá é de ficar esparramada na cama, encontrando a posição certa para não dormir. Agrada-me ficar acordada, mas não é o suficiente para expulsar o que tira meu sono. Tem dias que fico assim, meio gorda, meio feia, meio magra, nunca bonita e sempre preguiçosa. Tenho a virtude de estar sempre entre as coisas, amassadinha pelo cotidiano das dúvidas, entre as estrelas da manhã, me equilibrando na gangorra durante o intervalo de emoções, tanto sejam tropeções do percurso, quanto sejam nuances de humor. Assombrosamente, me desvirtuo de tudo que vivi até então, me desfaço dos meus nós e aceno para o destino como quem se despede de outras vidas: eu me tenho e ainda me sobro.



Mesmo assim, é a melancolia que me devora as pernas quando vou caminhar do quarto em direção à sala. Tenho os pés em carne viva, mesmo com a pele morta, como se meu corpo fosse um forro remendado dessa minha alma de retalhos. Suplico aos ventos e aos gritos, mas todos fazem questão de não me ouvir. Não sou notada nem reconhecida nem mesmo durante qualquer tempestade que castigue meus atos, quanto mais meus sentimentos. Quase não sei pra que sirvo, só imagino por mais quanto tempo minha vida vai permitir essa dúvida. De onde saem tantas sensações ruins que, num ato desesperado de existir, costumo chamar de pressentimentos? Ainda não descobri se me valho do passado para suportar o breu dos sortilégios ou se prefiro ser a pecadora que, à luz do desespero, transgride seus costumes para seja compreendida na dúvida da existência.


No fim das contas, não sei se sirvo para viver ou se vivo para servir. Meu coração não serve mais para a vida nem para a morte, mas ainda existe por alguma razão: ainda posso senti-la mesmo sem sabê-la.