quinta-feira, 4 de outubro de 2012
Estocolmo
quarta-feira, 3 de outubro de 2012
sábado, 29 de setembro de 2012
Nove da manhã
domingo, 8 de julho de 2012
Girassol
segunda-feira, 20 de junho de 2011
As janelas do mar
domingo, 2 de janeiro de 2011
Mudanças
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Cinzas da manhã
Eu gosto das manhãs cinzas e esfumaçadas. Como as de hoje. Fico quietinha dentro de mim, procurando fora do corpo um pedacinho de luz. É gostoso buscar palavras que signifiquem um sentimento que não sei o nome. E será que ele existe? Às vezes acho que existem sentimentos que não têm nome. Como o vapor quente que se apossa do meu ventre e sobe ao coração.
A minha janela é pequena. É de lá que vejo os passarinhos e as antenas dos outros prédios confundindo as paisagens. Dá saudade do mar, mas não das águas azuis e transparentes, e sim do oceano branco da ressaca, igual à colcha da cama, outro leito para navegar. Ainda não sei bem porque as manhãs se parecem com as águas, porque as antenas se entrelaçam com os passarinhos, mas sei que as cinzas enferrujadas do meu coração me queimam o ventre. Hoje acordei com vontades de domingo.
As ruas ficam tão longe de mim, não me levam a lugar algum. Sou mais ansiosa quando penso em não ser tão ansiosa, ergo construções fiéis às minhas projeções, todas em mim, todas rascunho. Os pinheiros, as amendoeiras, os coqueiros da minha janela estão acizentados. Meus olhos turvos, foscos. Como se minha pele fosse outra pele, como se minha voz fosse outra voz. Minhas vontades de domingo são transparentes, quase metálicas. Hoje estou vazia e a falta de mim, dentro de mim, me conforta, porque sei que toda mulher tem em si o desejo conflitante de uma solidão inversa: proteger-se.
As manhãs metálicas têm gosto de saudade. É tão forte, é tão gritante a vontade de saber das pessoas. Saber que aquele senhor do ponto do ônibus vai ser aquele senhor do ponto do ônibus. Sempre. Mas por que está ali? Para onde vai? E a moça que vende salgadinhos? Nunca comprei uma coxinha que fosse, um risole de frango, mas sempre a procuro, sempre a encontro, e meu coração ganha um acalanto toda vez que vou trabalhar e vejo o senhor do ponto de ônibus e a moça dos salgados. Em dias coloridos ou cinzas. São pessoas que são parte de mim e nem sabem disso. Porque sou um pouco todo mundo, tem Carmens que existem fora de mim e vêm me buscar nos pequenos gestos sem cor, mas que têm vida. Eu vivo nas pessoas anônimas. Eu gosto de me ter nos outros, de ler quem são, de escrever quem sabe? Porque minha alma cigana, meu nomadismo afetivo, meu sofrimento do amor, são restos do meu coração ferido, mas vivo, que erra, que faz besteira, que falha, que não se permite mais.
Hoje acordei mesmo sem ter dormido. Sonhei e fui tudo, fui menos, fui mais do que sou. A cama vazia com lençóis bagunçados, travesseiros dobrados, cheiros que não voltam. Memórias que ficam. Cinzas da manhã.